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Guardiões do Santíssimo Graal. O desalento.

Sessaram-se os sonhos, os pesadelos e as dores de cabeça. A rotina voltou ao costumeiro: casa, banco, banco, casa. No dia a dia, notei uma certa prostração da minha avó. Minha mãe não tanto, mas a vovó ficava apenas rezando o dia todo, sentada em sua cadeira de balanço. Senti uma angústia ao vê-la assim, triste. Diferentemente de lá, onde ela tinha uma rotina de reuniões, missa diária e almoço na companhia do padre, o que a deixava muito feliz. Foi então que minha mãe me contou que ela estava ansiosa para alugar uma casinha e ir embora para o interior. Pensei que era uma boa ideia, pois seria um passo em direção a um possível retorno para a nossa querida cidade. Foi então que minha mãe falou que iria com ela procurar uma casinha para alugar. Considerei pedir uma folga no trabalho para ir com elas também, e assim fiz. Só que, para minha surpresa, não era para a nossa cidade, mas sim para o interior da infância dela. Lá, ela tinha uma irmã ainda viva dos oito irmãos que eram, e também muitos parentes. Inclusive, há um bairro e um povoado nessa cidade com o sobrenome da minha avó. E assim, sua vontade foi feita: casa alugada e minha avó volta ao seu passado. Só que, para mim, parecia um distanciamento entre mim e a minha vovó, e também entre a cidade do meu passado. Então, me abri com ela, coisa que nunca fazia. Ela compreendeu minha angústia e falou que a nossa cidade, sem o meu avô, não seria a mesma para ela e que a presença da sua irmã e sobrinhos talvez preenchesse o vazio deixado pela ausência do meu avô.

Compreendi que a separação da nossa família era irreversível. Minha mãe se dividia, um tempo lá com ela e outro aqui comigo, e assim me distanciei ainda mais do meu passado. Alguma força poderosa parecia impedir um regresso. Lembrei-me dos objetos deixados no carro e resolvi guardá-los em casa. Abri o porta-luvas e retirei o escapulário. Como estava sem camisa, coloquei-o no pescoço. Abri o porta-malas e retirei a pedra. Notei que o peso era bem maior, bem maior mesmo. Retirei com um esforço muito maior do que quando a retirei do quartinho das tralhas. Achei estranho. Coloquei aquela pedra bem mais pesada agora num canto da garagem. Eu sentia que aquela pedra oca não tinha nenhum valor, além do valor sentimental que eu lhe atribuía. No entanto, o escapulário tinha um valor efetivo muito grande para mim, especialmente depois da morte do meu avô e do afastamento da minha avó. Era como se todo o amor e os conselhos que eles me deram durante a infância estivessem presentes naquele objeto. Usava-o como uma forma de reparação pelos desgostos que lhes causei, já que sentia que nunca retribuí adequadamente o amor que recebi.



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