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Eu vi um menino correndo.

Voltar ao passado e se encontrar consigo mesmo é algo impossível pelas leis da física, pois não é possível alterar eventos que já aconteceram. Entretanto, teoricamente é possível voltar ao passado e enxergar a energia daquela época. Essa energia pode nos inspirar a buscar sempre a excelência em nossas vidas, honrando a memória daquele menino para quem o "para sempre" e o "tudo é possível" eram convicções inabaláveis. Ao revisitar minhas lembranças, percebo como falhei com aquele menino e sinto a responsabilidade de não cometer os mesmos erros novamente.

Acertar meus passos e escolhas é importante para honrar a memória daquele menino que corria, brincava e sorria sem medo. Quero me ver novamente confiante, sem barreiras para alegrias, sonhos e esperanças. O mundo era uma imensa nave a ser explorada e quero recuperar esse sentimento. Buscando minhas lembranças lá no fundo, reencontro o brilho no olhar que se anuviou com o tempo, tornando-se opaco e distante. Percebo o quanto me afastei daquele menino, procurando apenas a quietude e a rotina. Já está mais do que na hora de resgatar sua energia e brilho, e seguir em frente com uma perspectiva renovada.

Aquela criança não tinha medo de correr, de cair, de se aventurar no desconhecido. O tempo não passa, nunca passa, porque ele não existe. O que existe é a distância, que nos afasta daquilo que amamos. Mas se retornamos ao ponto de partida - aquela cidade, aquela rua, aquela esquina, aquele perfume, aquela voz, aquele céu - então retiramos a distância que nos separa do passado, e passado, presente e futuro se tornam antigos. As coisas mudam biologicamente, fisicamente e quimicamente, mas as lembranças não.

As lembranças são atemporais e tudo se resume apenas à distância, nada mais que distância. O partir, o voltar, ou ficar, tudo só depende de movimento e a distância é flexível e não deve nos conduzir. Um menino jamais sonha com a partida, ele quer tudo para sempre: os pais, os amigos, as brincadeiras, tudo. Quando deixamos o menino escapar, é que ficamos perdidos na procura do para sempre e então mudamos, nos distanciamos e sem raízes, a vida se torna um vácuo. Esse impulso de percorrer longas distâncias só nos faz sonhar, sonhar e culpar o tempo. Mas o tempo é apenas uma ilusão, o que realmente importa é o aqui e o agora, o presente que construímos e vivemos. Precisamos valorizar as nossas raízes, nossas origens e aqueles que nos fizeram ser quem somos hoje. E assim, acolher e resgatar aquele menino que um dia fomos, para que possamos voltar a ser confiantes, alegres e cheios de sonhos, sem medo do desconhecido e sem nos distanciarmos de nós mesmos.

O tempo não leva, não traz e não percorre distâncias. Em outras terras, em algum outro lugar, estaremos permanentemente lembrando do lugar onde viveu um menino contemplativo. Ao refletir sobre a minha vida, percebo que, por mais distante, saudoso e feliz que eu possa estar, estarei sempre em busca daqueles momentos de brincadeiras, candura, confiança e certezas, quando não levávamos a vida tão a sério. Ignorando o tempo, quem precisa correr agora sou eu, para zerar distâncias e alcançar a plenitude. Por enquanto, continuo cantando: 'adeus, adeus, adeus ó terra querida'.



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